TUDO SOBRE PROTEÍNAS

22/04/2011 14:23

 

Muitas vezes criam-se mitos ao redor de determinados assuntos e estes adquirem
status de verdade absoluta, as dietas muito ricas em proteínas são um exemplo desses
infundados dogmas, de modo que há um consenso entre praticantes de atividades
físicas, leigos e alguns profissionais de que altíssimas quantidades de proteínas são
essenciais para que se obtenha resultados que variam desde redução do percentual de
gordura até hipertrofia muscular.

Segundo CARPENTER (1986) as atribuições inerentes
a proteína são baseadas na idéia de Liebig, para quem este macronutriente era a fonte
de energia dos músculos, assim como a observação de que as pessoas (e nações) mais
bem sucedidas e influentes tinham uma ingestão protéica mais alta.
Mas quais são as bases científicas para esta teoria? Será que ela é verdadeira?
INTRODUÇÃO ÀS PROTEÍNAS
Peço que não pulem esta parte, pois a compreensão de alguns conceitos e reações
apresentados aqui será muito útil no futuro.
A proteína é uma molécula relativamente grande formada pela união de blocos
menores denominados aminoácidos, os quais recebem este nome por possuírem um
radical amino (NH2) e um radical ácido orgânico, tecnicamente denominado carboxila
(COOH). Além desses dois radicais, os aminoácidos possuem uma cadeia lateral que lhe
dará características específicas. Estes “blocos” podem se combinar de infinitas
maneiras, formando diferentes proteínas como insulina, hormônio do crescimento e
proteínas musculares.
Nosso corpo tem a capacidade extremamente limitada de armazenar aminoácidos,
transformando o excesso de proteína em outras substâncias. No inicio dessas reações,
a proteína é degradada a aminoácidos, os quais tem seu nitrogênio retirado por um
processo denominado desaminação (lembrem-se que a proteína é o único
macronutriente que possui nitrogênio). Após a desaminação, o nitrogênio é excretado
pelos rins na forma de uréia. Se o organismo recorrer com muita freqüência a estas
reações pode ocorrer sobrecarga do fígado e rins, principalmente em pessoas
predispostas.
O esqueleto restante da desaminação será, então, usado em outros processos, ou
seja a proteína que excede a necessidade metabólica simplesmente é convertida em
outras moléculas (inclui-se aí a gordura) ou usada como energia.
Estando o nitrogênio presente no produto das reações de “quebra” de proteínas, a
sua excreção é diretamente relacionada aos resultados deste processo, sendo a
relação entre ingestão e eliminação de nitrogênio chamada balanço nitrogenado.
Quando houver mais nitrogênio sendo ingerido que eliminado, ocorre o balanço
nitrogenado positivo, ou seja, o corpo reteve a proteína (anabolismo), já o
desequilíbrio a favor da eliminação é denominado balanço nitrogenado negativo
(catabolismo).
VANTAGENS DA PROTEÍNA
• Menor resposta de insulina em comparação com os carboidratos: a insulina
inibe a liberação de hormônio do crescimento e media o processo de acúmulo
de gordura, sendo assim é interessante evitá-la em alguns casos. Porém este
hormônio também influencia positivamente na construção de tecidos e
absorção de creatina, o que é muito interessante para pessoas que almejam
ganhos de massa muscular (GUERRERO-ONTIVEROS, 1998),
• Maior indução da termogênese: alimentos ricos em proteínas induzem maior
gasto energético durante a digestão (LeBLANC et al, 1991).
• Menor quantidade de calorias em relação a gordura (porém um pouco maior
em relação aos carboidratos).
• Alimentos protéicos geralmente são menos saborosos e o processo digestivo
mais complexo, o que acaba por levar a menor ingestão calórica.
• Alguns aminoácidos (essenciais) não são sintetizados pelo corpo, só podendo
ser obtidos pela alimentação (ou suplementação).
O QUE DIZEM AS PESQUISAS
Já em 1975, MUNRO afirmava a existência de um mecanismo eficiente de
reciclagem de aminoácidos, relatando que o metabolismo protéico na musculatura
esquelética exibe eficiência considerável na reutilização de aminoácidos essenciais, o
que nos levaria a questionar se altas quantidades de proteínas seriam realmente
necessárias.
Há alguns experimentos que podem ser usados a favor das dietas
hiperprotéicas, mas maior problema destes estudos é o fato de não considerarem a
ingestão calórica total, essas limitações levaram autores como WOLFE (2000) a
concluir que ainda não seja possível formar um consenso quanto aos benefícios dos
suplementos de proteínas e/ou aminoácidos. MUNRO (1974) aborda o problema com
propriedade ao afirmar que um aumento na ingestão calórica será frustrado se a
ingestão de proteínas for muito baixa, assim como um aumento na ingestão protéica
de nada valerá se a ingestão calórica for baixa. PROCTOR et al (1991), parecem
concordar e consideram que uma dieta composta de 15-20% de proteínas é suficiente
para atletas (de força ou de resistência) desde que haja uma ingestão calórica
adequada. Segundo LEMON “talvez o fator mais importante a determinar as
necessidades de aminoácidos/proteínas seja a ingestão de quantidade adequadas de
calorias”.
Nesta linha, DOHM (1984) afirma que apesar de tanto atletas de endurance
quanto de força necessitarem de maiores quantidades de proteínas em termos
absolutos, a ingestão relativa “normal” será suficiente se as calorias ingeridas forem
adequadas. PAUL et al, realizaram um estudo em 1989 onde se afirma que apesar dos
atletas necessitarem de mais proteínas que pessoas sedentárias em termos absolutos,
quando se expressa essa quantidade em relação à quantidade calórica total, as
porcentagens diferem muito pouco.
Em 1993, ECONOMOS e outros pesquisadores realizaram uma revisão de
literatura procurando avaliar as recomendações nutricionais seguidas por atletas de
elite. Segundos os autores, havendo ingestão calórica suficiente, a suplementação de
proteínas não se faz necessária, para eles, atletas em treinamento deveriam manter
cerca de 70% da sua ingestão calórica provenientes de carboidratos. Na opinião dos
autores nenhum alimento isolado melhorará a performance dos atletas, e o aspecto
mais importante seria seguir as orientações básicas de uma alimentação saudável.
Em alguns experimentos, mesmo o aumento da ingestão protéica em cerca
100% se mostrou ineficiente. No estudo de CAMPBELL et al (1994), os participantes
recebiam 0,8 ou 1,6g/Kg/dia de proteína, os resultados não mostraram diferenças nas
medidas da composição corporal nem nos componentes do metabolismo energético
durante as 12 semanas de treinamento de força. Outra pesquisa que revelou a
ineficiência do aumento da ingestão protéica foi realizada por LEMON et al (1992)
onde observou-se a influência da elevação da quantidade de proteínas na massa
muscular e força. Foi comparado o uso de 2,62g/Kg/dia de proteínas com 1,35g/Kg/dia
durante um mês de treinamento intenso. Ao final do experimento, os ganhos de força
e massa muscular não diferiram entre os dois grupos. De acordo com os resultados, a
quantidade de proteína necessária para manter um balanço nitrogenado neutro foi de
aproximadamente 1,4-1,5g/Kg/dia, sendo a quantidade de 1,6-1,7g/Kg/dia
recomendada para um balanço nitrogenado positivo.
Considerando que a demanda energética esteja sendo devidamente equilibrada
com a alimentação, diversos autores concluem que dietas compostas de 12-15% de
proteínas, fornecendo 1,2-1,6 g/Kg/dia são suficientes para atletas de força. Alguns
exemplos são: LEMON (1988):1,2-1,6g/Kg por dia; LEMON et al (1992): 1,6-
1,7g/Kg/dia; WILLIAMS (1995), 1,2-1,7g/Kg/dia.
DOLNY et al (1984) E LEMON (1991) sugerem um pouco mais, recomendando
aos atletas consumir de 1,5 a 2 g/Kg/dia, porém afirmam que estas quantidades
podem ser facilmente obtidas através de uma dieta composta de 12 a 15% de
proteínas.
Muitas vezes a suplementação protéica proporciona apenas uma correção, a
qual ocorre nos níveis de proteína ou simplesmente na ingestão calórica. Em 1988,
CHIANG et al comprovaram a influência da ingestão calórica na retenção de nitrogênio,
mantendo-se a ingestão protéica em cerca 1,25 g/Kg de massa corporal. Durante o
experimento elevou-se a ingestão calórica em 15% e depois 30%, o que fez a retenção
de nitrogênio aumentar de 7,2 mg/Kg/dia para 23,8 mg/Kg/dia e 33,3 mg/Kg/dia
respectivamente. Como visto, não foi necessário subir a quantidade de proteínas, mas
apenas aumentar a ingestão calórica total. Detalhe que esta quantidade de 1,25
g/Kg/dia é o limite inferior da recomendação de muitos especialistas.
MELHOR MANEIRA E MOMENTO INGERIR
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Apesar de quantidades adequadas de proteínas (não doses muito elevadas)
poderem beneficiar tanto indivíduos treinados quanto sedentários, os efeitos são mais
evidentes em praticantes atividades físicas. Para WOLFE (2000) tanto a composição do
suplemento ou refeição, quanto a hora de ingestão são importantes no resultado, o
que não significa necessariamente dividir sua ingestão diária em inúmeras doses com
pequena concentração de proteínas.
Apesar de haver aumento do catabolismo após exercícios com pesos, isto é
comparativamente reduzido em relação ao aumento da síntese protéica, que pode
durar até dois dias. A elevação do anabolismo é ligada a disponibilidade intramuscular
de aminoácidos e conseqüentemente ao aumento do fluxo sangüíneo e entrega de
aminoácidos ao músculo. Sendo assim, a administração de aminoácidos após
exercícios aumenta a síntese de proteínas enquanto atenua o catabolismo,
melhorando o balanço nitrogenado (TIPTON et al, 1998).
BIOLO et al (1997), verificaram que a hiperaminoacidemia é 30-100% mais
eficiente quando ocorre após atividades físicas. A síntese protéica após o exercício
também foi maior que no repouso (291 +/- 42% vs. 141 +/- 45%), porém o catabolismo
muscular não foi significativamente afetado. Segundo os autores, a ingestão protéica
após atividades físicas pode ser mais anabólica do que em qualquer outro período.
Seguindo esta tendência do melhor aproveitamento após atividades físicas,
Bryan Haycock propôs o protein pulse feeding, um método revolucionário que
recomenda a concentração de grande parte da ingestão protéica (80%) no período
pós-treino. (tratarei deste método em um artigo específico).
Como foi dito anteriormente há uma grande distância entre a ingestão de
proteínas e sua disponibilidade, o que levou cientistas a criarem variações deste
macronutriente, como a whey (lactoalbumina, obtida do soro do leite) e os pools de
aminoácidos. Outra evolução dos suplementos foi melhorar as proporções de
aminoácidos, aumentando o valor biológico dessas proteínas. Dentre os suplementos
encontrados no mercado, tanto os compostos de aminoácidos, quanto o whey são os
que unem melhor estas características.
CONCLUSÃO
Indiscutivelmente a proteína é necessária, mas deve ser ingerida de forma
consciente e equilibrada, não há porque faze-la de maneira extrema, conforme
recomendam muitos “especialistas”. Faltam bases científicas suportando a teoria de
que ingestões protéicas muito elevadas trarão os benefícios prometidos, afirmar que
esta relação seja tão simples é manipular errada e perigosamente conceitos da
fisiologia humana até porque, além da eficiência questionável, há a probabilidade de
sobrecarga dos rins e fígado, com conseqüentes riscos a saúde.
Não estou condenando a suplementação protéica, somente questionando a
dieta absurdamente rica em proteínas. Os suplementos podem ser úteis na medida
que oferecem proteínas facilmente digeríveis e de altos valores biológicos. Além disso,
estes suplementos podem beneficiar vegetarianos e pessoas muito ocupadas, com
dificuldade de se alimentar adequadamente, para elas os compostos hiperprotéicos
mais completos são de grande valia na manutenção de uma alimentação saudável.
Atrás da dieta rica em proteínas, como em todas as teorias radicais, há mais
interesses financeiros do que humanos, tanto que sua propaganda é invariavelmente
feita através de apelos emocionais e empíricos, quando deveriam ser científicos. Por
incrível que pareça, a quantidade calórica é mais importante que a composição da
dieta na maioria dos casos. A simples prática de uma alimentação equilibrada e
coerente com sua demanda metabólica é a melhor maneira de potencializar o
resultado dos seus treinos.
Da próxima vez que tentarem ingerir a terrível (e quase sempre insolúvel)
albumina, se empaturrarem de claras de ovo ou gastarem uma nota em suplementos,
pensem no porquê desta prática e se perguntem: será que vale a pena?